10.1.09

Por que o bombardeio a Ashkelon é a mais trágica ironia

Terça, 30 de dezembro de 2008

Como é fácil repreender a história dos palestinos e apagar a narrativa de sua tragédia, e eximir uma grotesca ironia sobre Gaza, a qual – e em qualquer outro conflito – jornalistas escreveriam em suas primeiras reportagens: que os donos originais e legais da terra israelense, que o Hamas bombardeia com mísseis, pertence na verdade aos que vivem em Gaza.

É por isso que Gaza existe: porque os palestinos que viviam em Ashkelon e nas redondezas – Askalaan em árabe – foram desapropriados de suas terras em 1948 quando Israel foi criado, e foram posteriormente encerrados nas praias de Gaza. Eles – suas crianças, netos e bisnetos – estão entre o milhão e meio de palestinos refugiados que se espremem na cova que é Gaza. Oitenta por cento dessas famílias viviam onde hoje é Israel. Isto, historicamente, é um fato: a maioria do povo de Gaza não veio de lá.

Mas, acompanhando o show de notícias, você pode achar que a história começou ontem. Quando um bando de barbudos anti-semitas e lunáticos religiosos pipocou repentinamente das favelas de Gaza – um depósito de lixo humano de um povo destituído de suas origens – e começou a atirar mísseis na democrática Israel de paz e amor, só para conhecer o poderio bélico da força aérea israelense. O fato é que as cinco irmãs assassinadas em Jabalya foram mortas por bombas vindas do mesmo lugar de onde seus avós viviam. Mas essa parte não é contada.

Tanto Yitzhak Rabin quanto Shimon Peres afirmaram, nos idos anos 90, que desejavam que Gaza desaparecesse, fosse embora mar a dentro, e vocês podem ver o porquê. A existência de Gaza é uma lembrança permanente de centenas de milhares de palestinos que perderam seus lares, e que tiveram de fugir da limpeza étnica iniciada por Israel, há 60 anos, quando a maré de refugiados vindos dos campos de batalha da Segunda Guerra, deixou a Europa e obrigou com que os árabes fossem enxotados de suas terras, tudo sem que o mundo se preocupasse.

Bem, o mundo devia se preocupar agora. Espremidos na maior concentração populacional do planeta, esse povo desapropriado tem vivido na rejeição e selvageria. E nos últimos seis meses sem energia ou comida, sanções essas impostas por nós, o Ocidente. Gaza sempre foi um lugar de revoltas. Sobreviveu aos dois anos de sangrenta “pacificação” imposta por Ariel Sharon em 1971, e não será agora que Gaza se ajoelhará.

Nas alas palestinas, a sua mais poderosa voz política – estou falando do atrasado Edward Said, não do corrupto Yassir Arafat (e como Israel deve sentir falta dele) – está silenciosa. Dada a complicada situação tudo é inexplicável para seus falastrões. “É o mais terrível lugar que já estive”, disse Said em Gaza. “É horrivelmente triste porque o desespero e a miséria são as únicas coisas conhecidas pelas pessoas. Eu não estava preparado para campos piores do que os que vi na África do Sul.”

Claro, eles foram abandonados pela ministra do Exterior de Israel, Tzipi Livni, quando admitiu que “algumas vezes os civis também pagam o preço”, um argumento que ela não faria, obviamente, se as estatísticas de fatalidades fossem do lado inverso. Certamente, foi instrutivo ouvir ontem, um membro do American Enterprise Institute (centro de estudos conservador financiado por uma das maiores petrolíferas do mundo*) – que lealmente reproduziu os argumentos israelenses – defendendo a ultrajante taxa de morte palestina, ao dizer que era “apenas um mero detalhe dentro dos números do jogo”. Porém se mais de 300 israelenses tivessem sido assassinados contra dois palestinos mortos, tenho certeza que os “números do jogo” e a desproporcional violência seria de total relevância. O fato é simples: as mortes palestinas importam muito menos do que as mortes israelenses. Verdade, nós sabemos que 180 das mortes eram de membros do Hamas. Mas e o restante? Se as Nações Unidas considera o número falso de 57 civis mortos como exata, ainda assim tal taxa seria uma desgraça.

Ver que tanto EUA quanto Grã-Bretanha negam-se a condenar os violentos ataques de Israel enquanto condenam abertamente o Hamas, não é surpresa. A polícia estadunidense no Oriente Médio e a polícia israelense são inseparáveis e Gordon Brown é o mesmo seguidor do governo Bush, assim como seu predecessor.

Como de costume, os senhores árabes – amplamente armados e pagos pelo Ocidente – estão absurdamente calados, do topo da crise na qual irão (se garantirem seus lugares), escolher um “comitê de ação” para prover um relatório quer nunca será terminado. Essa é a forma do mundo árabe e suas corruptas leis. Essa é a forma como o Hamas que irá aguardar a confusão desses poderosos árabes, enquanto cinicamente aguarda que Israel se pronuncie. Como eles querem. Na verdade, em poucos meses, ouviremos que Israel e Hamas tiveram “conversas secretas” – assim como nós fizemos com Israel e mesmo com o corrupto PLO (Organização pela Libertação da Palestina – OLP). Mas até lá, os mortos estarão sepultados e estaremos encarando a próxima crise, desde a última crise.

Robert Fisk: Why bombing Ashkelon is the most tragic irony - Tuesday, 30 December 2008

Um comentário:

mrsdepp disse...

bah eu tenho muitos posts para lacançar a leitura.. ando preguiçosa em relação ao blogs! (inclusive o meu!!)prometo ler e comentar tudo aos poucos!