13.11.06

De quando eu conheci o Amor



Na primeira vez que vi o Amor, ele vestia uma bela a elegante camisa vermelha de listras brancas. O cabelo molhado, negríssimo, e um cavanhaque bem aparado. Os olhos brilhavam, como se gotas de orvalho tivessem acabado de visitar-lhes.

Conversamos por horas e horas, e por alguns momentos sentia que brincava comigo, como se eu fosse a questão improvável, e não ele, o Amor. Lembro de uma pergunta: “Pois, bem, quem é o seu prometido?” Sai de mim, pensei na hora: “Bem, onde me enfiei mesmo?!” Respondi que ninguém, mas se o soubesse, ah se soubesse! A pergunta era ingênua, como tantas outras curiosas que ele me fazia o tempo todo. Talvez ingênua não seja uma palavra correta, mas o melhor talvez seja pura. Se o Amor existe ele é puro!

Lembro da primeira vez que fiquei muito sem graça, sim o Amor constrange, e pus as mãos no rosto para esconder meu rubescimento, ele na hora quis me mostrar como as meninas de lá faziam. E ai fui eu quem caiu na gargalhada. Esqueci de ficar enrubescida, de repente o Amor havia virado a melhor companhia do mundo.

Conversamos e rimos e contamos histórias e inventamos mais uma porção delas até o sono derrubar-nos, e quando o sono venceu, dormimos rápido para sonhar que ainda estávamos juntos. E quando acordamos mais uma vez o mundo virou mero figurante. Mais uma vez estávamos lá, rindo, contando, conversando.

A primeira vez que ouvi a voz do Amor percebi que tem forte sotaque. E que as vezes se confunde, fala daqui e fala de lá e acha que posso entendê-lo. Eu respondo “ok, ok doce coração!” Ele finge que acredita que entendi. Na verdade, pouco importa, porque se olho em seus pequenos olhos entendo o que seu coração quer dizer, e basta.

O Amor me apresentou seus irmãos um dia. Não sabia, mas o irmão do meio do Amor tem o semblante de seriedade. Sabe? Daqueles que te passam um certo medo de parecer boba, e total confiança no que falam? Pois é. O irmão mais velho do Amor me pareceu mais aberto. Mas ambos igualmente amáveis! O irmão mais velho também gostou de meu nome! Gostei deles. Principalmente quando sugeriram ao Amor vir me ver. Descobri também que o Amor é o mais novo.

E foi assim por dias que valeram a vida toda. O Amor me escrevia poesias, inventava reinos e fadas, e até modernas histórias. Também fazia caras e bocas e cuidava de me deixar sempre o mais feliz possível e segura. Não sei como dizer, mas o Amor me fez esquecer toda a minha mesquinha vida até então. Me fez mergulhar de cabeça. E o mundo tomou cor, cheiro e som, como jamais antes visto.

Mas um dia o Amor chorou, e passou a noite em claro. Não falando comigo, mas sofrendo também. Nessa noite eu e ele pedimos por um milagre. E quando acordei, precisei ouvir sua voz mais uma vez. Precisei dizer-lhe que minhas esperanças estão guardadas, assim como ele e todos os seus gestos e expressões. E disse-lhe que eu estaria sempre com ele. Disse a mim mesma que não faria o Amor sofrer, mas que continuaria a cuidar do seu doce coração, e todos os dias conservaria a pureza dele. No dia que o amor se despediu de mim, ele pôs minha camisa favorita, a vermelha de listas brancas. A barba crescida depois de uns dias, e os olhinhos fundos, um pouco inchados.

Nosso milagre não veio como esperávamos, é verdade que ainda aguardamos. Mas o mais precioso de ter conhecido o Amor, foi ter sentindo o seu milagre. O milagre de ter acontecido comigo, num dia casual, numa época difícil. O Amor me fez crer em paraíso, me fez crer no céu. Me fez sentir-se como sua prometida.
Ah se nós dois soubéssemos!

Pausa



Olho da Tempestade
Blindside

Eu acho que fiquei pela última vez
Adeus
Esperança está muito mais próxima da beleza do que a tristeza
Eu acho que vou deixar e deixar a piedade própria, para morrer.
Reflexões são sempre mais brilhantes do que sombras

Por favor, venha mais perto.
Porque eu não posso te tocar mais
Por favor, veja, eu estou andando até o olho da tempestade.
E eu continuarei te amando ainda mais

Amor está no ar esta noite
Então respire!
Você deu certeza de que a atmosfera estaria densa esta noite
Então isso é onde começa e onde termina
Com uma rachadura num céu negro cortando a luz

Por favor, venha mais perto.
Porque meu coração não toca mais o Teu
Por favor, veja, eu estou andando até o olho da tempestade.
E eu continuarei te amando ainda mais

Amor está no ar esta noite
Então respire, respire meu espírito, respire.
Saia, saia agora e não olhe para trás

Despedida Boddah



Lembro do dia que o Chambinho me ligou para perguntar se eu não poderia quebrar um galho para os amigos dele, que tocariam num festival no fim daquela semana. Era terça-feira, o festival seria no sábado e as músicas umas quatro próprias.

Do convite descompromissado para o evento que nem rolou, a banda toda acabou indo ensaiar na sala de casa, e ganhou segunda guitarra. De lá pra cá, passaram-se quatro anos. A banda compôs cinco vezes mais do que o que tinha na época do festival, também a sonoridade ficou mais incrementada. O Geléia, primeiro baterista fixo mudou de cidade, a Didia lá de outra cidade entrou.

Nesse tempo, a banda acabou uma vez, voltou outras tantas, morou junta, fez grandes apresentações, outras não tão brilhantes assim. Gravou dois eps, saiu em coletânea, dinamizou divulgação de blog, flog, vídeos, contatos, até o segundo ep vem com faixa multimídia! Coisa rara de se ver pra banda que ainda produz seu próprio material...

É só um relato simples, mas estou fazendo isso pra organizar bem essas memórias numa caixinha grunge lá no coração.

A Boddah foi a primeira banda de fato pra mim. Foi aquela em que comprei meu primeiro contrabaixo, e o segundo também (porque o primeiro deu rolo, crediu!), foi lá também que por último ousei comprar uns pedais, que não cheguei a usar, mas que continuam sendo novos-briquedinhos-prontos-pra-brincar. Foi lá que compus todas as minhas linhas de baixo, e presenciei a composição de lindas, lindas músicas! Inclusive uma dessas tive a honra de ganhar de presente.

Também foi lá que podia sair de anônima na muvuca dos rocks da vida, e subir ao palco e bater cabeça, errar, pular, gritar com toda emoção que a prática permite, como os meus ídolos de adolescência faziam.

Bons momentos. Memoráveis! Mesmo tocando pra umas vinte ou trinta pessoas como foi nesta minha despedida, entre eles uns poucos amigos, foi especial sair como entrei, emocionada, e festejar com os três boddahs o fim de uma fase marcante e o começo de outra para todos nós.

Aos boddahs desejo um longo caminho de vitórias e conquistas. Mais talento não é necessário, mas se tiver como, desejo mais e mais. Ao Roberto, coração da banda, Sâmia, cabeça, e Dídia, braços, pernas e pedais, todo o sucesso! Que o jardim boddah possa florescer sempre. Eu que agora sigo de vez o meu caminho, uso essa carta pra relembrá-los de que qualquer coisa não precisa berrar duas vezes. Estarei próxima.
Se tem uma coisa que nada pode mudar é o fato de conhecermos nossas histórias(E isso só um longo tempo de convivência próxima pode dar).É o que de mais importante vou levar. Desde já aceitando convite pra uma sinuca, e convidando-os pra um almoço na casa nova!

Abraços da Fefê que em qualquer lugar ainda vai lembrar carinhosamente da família boddah. Deus os abençoe sempre!
Obrigada por tudo,
Amo vocês!
Fernanda ex-baixista Boddah Diciro

5.11.06

Da série: Crônicas domésticas

Lembro quando ela chegou era uma tarde chuvosa!
Pequenininha e com frio, veio embrulhada num pano de chão.
E fedia, hum, fedia, típico de cachorro novo.
Nessa época eu fazia a 4ª. série. Devia ter uns 10 ou 11 anos.
Quis que ela dormisse no meu quarto, mas a mãe não deixou.
“Vai detonar o seu quarto se for dormir lá!”
Na verdade, acabou dormindo do lado de fora, e chorou e arranhou tanto a porta da cozinha que não consegui dormir. Pensava que ela poderia estar com frio.
Irônico é que logo cedo, no primeiro dia dela lá em casa, eu levantei cedíssimo e fui correndo vê-la. Peguei-a e pus no tanque de lavar roupa, dei-lhe um banho daqueles.
Devia ser umas 5 horas da manhã. E como se já não fosse demorar bastante o sol aparecer pra coitada se esquentar, era um dia chuvoso. Por mais que a embrulhasse ela permanecia tremendo. Hum! Lembro disso!
Mas ela sobreviveu.
Sobreviveu também a fase que o meu irmão, novinho também, com uns 5 ou 6 anos vinha todo faceiro brincar com ela. Ela sequer levantava pra vê-lo. Ai, depois de um tempo isso começou a irritá-lo de forma que ele urinava nela pra se vingar.
Sei, é triste, mas a prática durou um tempo, durou até vermos e brigar com ele.
Sei que ele também prosseguiu por um tempo com a prática. Ai foi a Mila mesmo que teve de tomar uma atitude contundente.
Pra sorte do meu irmão ela nunca levou a cabo as investidas.
Foi por esse época que tivemos de prendê-la numa corrente.
Porque se ela via o mano, avançava, ladrava e provavelmente descontaria nele toda a humilhação.
Outro dia achei uma foto em que ele brinca com ela.
Não consigo lembrar de quando foi tirada.
Faz 13 anos que a Mila veio pra família.
Desde a época de atritos com meu irmão ela continua presa na corrente.
Hoje em dia ela ta bem grisalha, lembro que ela era pretinha! E serelepe, quando conseguia se soltar corria o máximo que podia, e saia de casa. Inúmeras vezes nos obrigou a correr atrás dela, inúmeras! Ela galopava! E a gente suando atrás. Quando conseguíamos pegá-la ela nos mordia, grilada, grilada! Era engraçado!
Teve o dia que ela se soltou e cismou com um fila, cuja a cabeça já seria quase o tamanho dela. E claro, sobrou pra mim!
Puros causos de família!
Fiquei pensando se do jeito que eu não lembro de quando foi tirada a foto dela com o mano, ela também não deve lembrar de como era estar solta.
Ou talvez se lembre, e anseie por isso. Ou talvez esteja cansada.
Liberdade é ou não é um desejo eterno?
E era só pra falar com saudades dela, que já ta com os olhos meio azulados.

1.11.06

Ensaio sobre uma rave. Experiências de uma roqueira na Jeroky.


“Vamos numa rave?”
A pergunta feita a uma baixista de rock alternativo, que jamais pisara em um ambiente de música eletrônica soou complexa.
“Uai... Quem sabe? Vamos ver...” Tentei esquivar, na verdade tantos compromissos já seriam justificativas justas para não sair de Palmas, encarar 15 horas num ônibus-forno pois o ar era constantemente desligado, que quebrou duas vezes (Isso para ir, porque na volta a diferença foi que não quebrou, mas também o ar não ligou nenhum minuto) – parecia uma aventura e tanto.
Fui.

Goiânia às 14hs do sábado, dia 28 de outubro. A rave era num clube na saída para Aparecida. Eu que não sou de lá, deixei que a motorista, a irmã do amigo que havia me convidado se resolvesse.
Às 16hs lá estamos nós adentrando. Na porta, dezenas de cambistas tentavam empurrar os últimos ingressos, enquanto outros tantos vendiam vagas em estacionamentos. Escolhemos o estacionamento oficial, carro etiquetado, etiqueta também na carteira, muitos policiais com cães no cercado que seria o estacionamento, mais uns poucos carros e eu pensando, “Bom, vamos aproveitar do começo ao fim, mesmo!”.
Mais a frente, mais seguranças e revistas. Não pode entrar nem comida, nem bebida. Acho que maconha pode, porque diferente do que eu esperava encontrar: muito ácido, durante a festa o que sentíamos mesmo, era o cheiro da erva no ar. E eu querendo embrulhar o estômago. Aff. Aliás tem esse mito de que em rave você vai ver comprimidos de ácido brotando do chão e coisa parecida, mas não vi nenhum! Chapados? Drogados? Sei lá, tinha tanta gente, e isso na boa, a gente ver as pencas nos rocks da vida.
Bem do lado da entrada umas lojinhas vendendo artigos típicos de tranceiros, aquelas batas psicodélicas, com referências hindus, colares e outros mimos. Do outro lado um palco com cúpula e generosas pa´s, típicos de rock(olha o espírito roqueiro tentando se ambientar). De ambos os lados instalações artísticas com tecidos que brilham a noite, lembravam totens. E na frente do palco várias tendas enormes, dando abrigo as poucas pessoas que já se requebravam. Ao fundo as barracas de bebidas. Nós, que nada tínhamos de bobos, já estocamos várias fichas de água, cerveja e suco. Preços também, iguais as festas de rock, porém o cachorro quente e minipizza (mini mesmo) a cinco reais, eu não pude concordar. Com 17 horas de tutis-tutis pela frente, o importante é manter-se hidratado!
O começo é acanhado, como todo começo costuma ser. Fico em pé, olho para um lado, para o outro, abstraio. Daqui a pouco me pego já batendo o pé e cadenciando os ombros. Escurece rápido porque o tempo fecha, eu penso: “Oba! Tem chuva!”. A essa hora já mudou de dj, e acredite, dá pra sentir as sutis diferenças de um pro outro. Também já está mais cheio, eu e meus cicerones, Wesley e sua irmã Ellen, já me fizeram sentir-se totalmente a vontade para estar mexendo o esqueleto tanto quanto qualquer um ali. Tiramos os tênis vamos pra frente das pa´s. e sentindo a caixa torácica vibrar junto, esquecemos de tudo. Segundo o Wesley esse é o começo do transe.
Começa a chover e todos correm pra debaixo das tendas, eu não, eu permaneço. E, de praxe, lavo até a alma. Esse foi o ápice da festa pra mim. Olho pro céu escuro, esqueço de todos os problemas e fico ali, na minha maneira, agradecendo a Deus pela vida. Vai entender como isso é possível, mas é, simples. O vento frio, e eu nem ai pra roupa que vai demorar a secar e a noite que só está começando. Esqueço da hipótese de resfriado, que aliás, também esquece de mim, ufa!
As 21hs eu peço arrêgo, preciso sentar e desligar um pouco. A Ellen que a essa altura já estava com náuseas do cheiro de maconha vem também. Sentamos na praça de alimentação, com as cadeiras molhadas da chuva. Do lado tinha outra pista, que seria o chill-out, ou pista de descanso. Lá também tem dj, só que achei a musica muito alta pra relaxar. Também faltou um pufe pra eu me escorar um tiquinho!
Umas duas horas depois chegou o Wesley e ai fomos pra uma lanchonete do clube, tudo imundo, mas o cansaço era tanto que deitamos ali mesmo. Aliás, imundos também eram nossos pés, só a lama e o barro.
Bodamos umas duas horas. Por volta de uma hora da madruga lá estamos nós outra vez, o que era grama virou lama e todo mundo da cintura pra baixo estava meio parecido. Mesmo os dois personagens nativos de rave que eu cataloguei, observe: a maioria das mulheres vão com minissaias, miniblusas e botas de camurça marrom, ficam parecidíssimas com a Tomb Ryder, não sei se é intenção mas estava cheia delas por lá. E os homens que geralmente têm longos dreads, e mesmo com o frio basta-lhes uma bermuda de tactel, já que como o Johnny Bravo querem mesmo é exibir o peitoral. Também têm muitas pessoas normais. Vi pouquíssimos ripongas, e era o que eu mais esperava encontrar. Tem também a pivetada emo, que não deve ter mais de 17 anos, e se cansa rapidinho, lá pelas dez já estão amontoados nos cantos.
Nessa hora estava tocando a maior atração, um dj de Israel, lá que além de judeus e guerras têm os melhores djs de trance da atualidade. O nome do cara é Astrix, e foi o melhor som da noite. Não tinha como ficar parado. E não fiquei mesmo. Nessa hora, chegar aos banheiros – que aliás tinha dezenas, com muitos guardas na frente, era uma odisséia. O Wesley especulou umas 8 a 10 mil pessoas. Eu sem noção de quantidade, só pude dar o meu parecer de que estava totalmente lotado.
Lá pelas 4 e meia da manhã, minhas pernas doíam e davam cãibras. Só agora minha bermuda começara a secar. Um frio daqueles, e eu concluindo porque o homem moderno não anda mais descalço. Fomos procurar abrigo. A Ellen que havia se desligado da rave desde quando levantamos pra ver o Astrix, curtia sua dor de cabeça lá na área que ficou o atendimento médico. Uns colchões no chão, uns cobertores de papel alumínio e uma galera deitada, passando mal. Interessante que mal sentamos e veio uma senhora de jaleco, perguntar se passávamos mal. “Não senhora, só cansaço mesmo!”. Nesse momento fiquei com inveja, nunca vi nenhum rock com amparo médico. E olha que o que fica de roqueiro jogado nos cantos, passando mal, nem em rave é igual.
Vinte minutos de descanso, já que não tivemos coragem de simular coma alcoólico pra ganhar um colchão, voltamos pra rave. Muita gente dançando, isso é muito legal, tem uma tonelada de pessoas e ninguém vem lhe aborrecer, aliás, percebi que rave é um lance muito individual, já que vc dança sozinho, e do jeito que vc quiser. De olhos fechados, correndo, parado, vale tudo. Amanhecendo o dia, todos munidos dos seus óculos de sol, e embora a festa fosse acabar dali a duas ou três horas, o movimento era como se a festa tivesse acabado de começar.
E eu? Adorei. É tudo bem diferente, estilos, sons, tudo. Mas a diversão é garantida, se você deixar-se levar pelo tuts-tuts. Estou pensando até em voltar em dezembro pra ver outra, dessa vez, tem banda no palco: a banda dos djs com guitarra, vocal, batera e baixo.