
Na primeira vez que vi o Amor, ele vestia uma bela a elegante camisa vermelha de listras brancas. O cabelo molhado, negríssimo, e um cavanhaque bem aparado. Os olhos brilhavam, como se gotas de orvalho tivessem acabado de visitar-lhes.
Conversamos por horas e horas, e por alguns momentos sentia que brincava comigo, como se eu fosse a questão improvável, e não ele, o Amor. Lembro de uma pergunta: “Pois, bem, quem é o seu prometido?” Sai de mim, pensei na hora: “Bem, onde me enfiei mesmo?!” Respondi que ninguém, mas se o soubesse, ah se soubesse! A pergunta era ingênua, como tantas outras curiosas que ele me fazia o tempo todo. Talvez ingênua não seja uma palavra correta, mas o melhor talvez seja pura. Se o Amor existe ele é puro!
Lembro da primeira vez que fiquei muito sem graça, sim o Amor constrange, e pus as mãos no rosto para esconder meu rubescimento, ele na hora quis me mostrar como as meninas de lá faziam. E ai fui eu quem caiu na gargalhada. Esqueci de ficar enrubescida, de repente o Amor havia virado a melhor companhia do mundo.
Conversamos e rimos e contamos histórias e inventamos mais uma porção delas até o sono derrubar-nos, e quando o sono venceu, dormimos rápido para sonhar que ainda estávamos juntos. E quando acordamos mais uma vez o mundo virou mero figurante. Mais uma vez estávamos lá, rindo, contando, conversando.
A primeira vez que ouvi a voz do Amor percebi que tem forte sotaque. E que as vezes se confunde, fala daqui e fala de lá e acha que posso entendê-lo. Eu respondo “ok, ok doce coração!” Ele finge que acredita que entendi. Na verdade, pouco importa, porque se olho em seus pequenos olhos entendo o que seu coração quer dizer, e basta.
O Amor me apresentou seus irmãos um dia. Não sabia, mas o irmão do meio do Amor tem o semblante de seriedade. Sabe? Daqueles que te passam um certo medo de parecer boba, e total confiança no que falam? Pois é. O irmão mais velho do Amor me pareceu mais aberto. Mas ambos igualmente amáveis! O irmão mais velho também gostou de meu nome! Gostei deles. Principalmente quando sugeriram ao Amor vir me ver. Descobri também que o Amor é o mais novo.
E foi assim por dias que valeram a vida toda. O Amor me escrevia poesias, inventava reinos e fadas, e até modernas histórias. Também fazia caras e bocas e cuidava de me deixar sempre o mais feliz possível e segura. Não sei como dizer, mas o Amor me fez esquecer toda a minha mesquinha vida até então. Me fez mergulhar de cabeça. E o mundo tomou cor, cheiro e som, como jamais antes visto.
Mas um dia o Amor chorou, e passou a noite em claro. Não falando comigo, mas sofrendo também. Nessa noite eu e ele pedimos por um milagre. E quando acordei, precisei ouvir sua voz mais uma vez. Precisei dizer-lhe que minhas esperanças estão guardadas, assim como ele e todos os seus gestos e expressões. E disse-lhe que eu estaria sempre com ele. Disse a mim mesma que não faria o Amor sofrer, mas que continuaria a cuidar do seu doce coração, e todos os dias conservaria a pureza dele. No dia que o amor se despediu de mim, ele pôs minha camisa favorita, a vermelha de listas brancas. A barba crescida depois de uns dias, e os olhinhos fundos, um pouco inchados.
Nosso milagre não veio como esperávamos, é verdade que ainda aguardamos. Mas o mais precioso de ter conhecido o Amor, foi ter sentindo o seu milagre. O milagre de ter acontecido comigo, num dia casual, numa época difícil. O Amor me fez crer em paraíso, me fez crer no céu. Me fez sentir-se como sua prometida.
Ah se nós dois soubéssemos!